Os meus últimos dois posts - antes do meu retiro de quase dois anos - deram origem a uma daquelas discussões de se lhes tirar o chapéu. A discussão decorreu durante algum tempo através dos comentários deixados neste blog por alguns dos meus leitores. A partir de dada altura, tornou-se claro que tais comentários já não se destinavam a mim, eram pura discussão independente, tendo este blog acabado por servir de arena.
Mesmo após eu ter tirado as minhas conclusões (e mais uma vez agradeço ao Perplexo e ao Pedro N pelos inteligentes esclarecimentos e pela sintonia ao longo da afronta), mesmo depois disso, as dúvidas mantiveram-se e proliferaram como uma epidemia. Até aquilo que para mim era certo desde o início – o curioso fenómeno estatístico conhecido por
problema de Monty Hall –, e que serviu aliás como catapulta para o patamar realmente intrigante da discussão, até isso já começava a ser posto em causa por terceiros. O que foi bom! Desse modo conjugou-se o lado intelectual do problema com o lado hilariante do mesmo.
Infelizmente, com o tempo, tais comentários desapareceram do blog (não faço ideia como) e o debate acabou por ficar esquecido. Mas eis as boas notícias: Homem prevenido vale por dois, e prevenção, nestas andanças da blogosfera, significa
backup.
Deixo-vos então - como remate definitivo do tema -, um apanhado dos pontos altos da discussão (nem sempre didáctica) que aqui decorreu através dos comentários aos meus dois posts anteriores. Riam-se...
Já agora, para aqueles que notaram a minha ausência, olá de novo...
Perplexo:
É muito interessante. O que parece óbvio numa apreciação superficial, não é afinal realidade. Se o apresentador descartasse 1 porta aleatoriamente, umas vezes eliminaria uma porta premiada, outras vezes uma porta não premiada. Não adiantaria ao concorrente mudar de palpite: a probabilidade de acertar continuaria a ser de 1/3. Mas o apresentador ao eliminar apenas portas perdedoras, só está a confirmar o que já se sabia - que nas 2 onde manda, pelo menos 1 é perdedora. Ao eliminá-la, a porta restante «herda» a probabilidade da porta descartada: sabia-se que as 2 portas tinham em conjunto 2/3 da probabilidade - a «herdeira» mantém esses 2/3. O exemplo dum milhão de hipóteses em vez de 3 (no site), é elucidativo e revelador. Tenho a noção que não fui claro, embora a questão se me tenha tornado clara.
SolipsistaMas eu coloco a seguinte possibilidade: o concorrente número 1 escolhe a porta B. Seguidamente, a porta C é descartada. A partir desse momento, há 1/3 de hipóteses de o carro estar em B e 2/3 de hipóteses de estar em A. Pronto, até aqui tudo bem. Nisto, o concorrente número 1 tem um enfarte e cai morto em pleno palco. Mas os produtores do programa resolvem continuar a sessão, indo buscar um novo concorrente à rua. Para se poupar tempo, o concurso prossegue a partir do momento em que fora interrompido. Este novo concorrente não é informado do que se passou antes da sua chegada. Depara-se com duas portas, A e B. Tem de fazer uma escolha. E a minha questão é: será que, para ele - que não sabe do que se passou antes - se mantém a vantagem da porta A ou será que, agora, vigora a regra dos 50/50? Melhor ainda: De repente, todas as testemunhas sofrem de uma amnésia, excepto uma, que começa a berrar da plateia que a porta A é melhor! Será que alguém a levaria a sério?...
Pedro N:O problema de Monty Hall refere a probabilidade condicional de um evento ocorrer se um outro evento (neste caso, não independente) já tiver ocorrido. Na continuação do teu exemplo, para o 2º concorrente as probabilidades seriam de 50% porque ele não possui a informação que detinha o 1º concorrente.
Solipsista... entretanto, ainda antes de o segundo concorrente se decidir por uma escolha, o primeiro concorrente recupera, milagrosamente, a consciência (e a memória), e retoma o jogo onde o deixara. Estão os dois concorrentes lado a lado, frente às duas portas, A e B... Ora, parece-me estranhíssimo que, para um deles, haja 1/2 de hipóteses de o carro estar em A e, para o outro, haja 1/3 de hipóteses de o carro estar nessa mesma porta. As probabilidades não deviam ser universais para todos os observadores? Logicamente, podemos invocar o teorema de Bayes e explicar o fenómeno através das probabilidades condicionais determinadas pela história anterior do primeiro jogador. Mas, na prática, parece-me persistir aqui um paradoxo qualquer: Se, por exemplo, o jogador que recupera a consciência não se lembrar do que se passou antes, ao escolher uma porta não estará a passar por cima das probabilidades condicionais? Terá a memória do seu próprio passado alguma interferência? Das duas umas: ou esta é uma questão completamente absurda ou então há aqui, de facto, uma pitada de esoterismo!!...
Perplexo:
A meu ver, o conjunto final é resultado duma história anterior. A porta A tem 1/3 de probabilidade vencedora, a porta B - 2/3 e a porta C - 0. Qualquer interveniente não informado pensa que cada porta restante tem 1/2, embora a porta A tenha 2/3. Não dispõe de informação privilegiada. Para o apresentador que tem toda a informação, uma tem 100% e as outras 0%. Não me parece haver contradição. Quem tem mais informação, tem vantagem. Como no poker. Mas não deixei de suspeitar que levando isto às últimas consequências, poderemos desembocar num determinismo qualquer.
Pedro N:
As probabidades sao medidas da nosssa ignorância. Quanto mais informação menor é a incerteza. Como disseram, se eu for o apresentador, o problema não tem probabilidades associadas, ou se quiserem, uma porta é a 100%, as outras a 0%.
PerplexoAprofundando: a probabilidade não é a realidade. A realidade é que a porta (tal) é premiada e as outras não. A probabilidade é uma medida aproximativa da certeza que cada observador tem e que varia com a informação. A maior aproximação à realidade reflecte a maior informação verdadeira de que o observador dispõe. A probabilidade é pessoal. O próprio apresentador, que pensava que tinha 100% de informação verdadeira e que por isso a porta (tal) tinha 100% de probabilidade ganhadora, se pode enganar, se entretanto o produtor tiver mudado o carro de porta, sem o avisar. Só para um Deus omnisciente que não admita livre-arbítrio autêntico, não faz sentido falar de probabilidades. Ele sabe.
Henrique:
Que discussão interessante de que só me dei conta agora. Apesar de a minha estatística já ir longe, reconheço tratar-se de probalidade condicional. Mas vou pensar melhor no assunto, porque vejo que pode ter algo de metafísico (estado que antecede a física), donde a sua enorme utilidade para a ciência. É uma pré-intuição da realidade e explica-os, à sua maneira claro.
Solipsista:Os últimos argumentos do Perplexo e do Pedro N foram, para mim, decisivos. O meu obrigado pelos seus esclarecimentos (e pela clareza e simplicidade com que souberam expô-los).
Bom Selvagem:Muitos rodeios para abordar o dilema do Monty Hall que dá sempre azo às explicações mais cómicas interpretando incorrectamente o teorema de Bayes, das probabilidades à priori (condicionais). A probabilidade de ganhar é 50% porque o apresentador lhe dá uma 2ª escolha. Senão seria 1/3. Nunca 2/3, para efeitos de tomadas de decisão. Sempre. Façam uma simulação.
Pedro N:Caro Bom Selvagem, as suas referências ao Bayes e aos condicionais são as melhores, mas a conclusão está errada. O jogador tem 2/3 de acertar aceitando a proposta do apresentador. Disso não há qualquer duvida. Basta seguir o link deste post que o nosso Solipsista referiu.
Solipsista:
Para acabar com as dúvidas: As probabilidades são ilusões psicológicas, artimanhas matemáticas para medirmos o nossa grau de ignorância. Na realidade (como não estamos a falar de gatos de Schrodinger ou de teorias quânticas alternativas à interpretação de Copenhaga), o carro está realmente por trás de uma porta. Quem souber qual a porta correcta tem 100% de hipóteses de acertar. Quem estiver na plena ignorância tem ½ de hipóteses perante duas portas. E no caso particular do problema de Monty Hall, o concorrente goza de alguma informação adicional que lhe permite considerar que uma das duas portas tem 2/3. Caso encerrado... A minha confusão inicial, que está indirectamente relacionada com o problema de Monty Hall, fora a seguinte: Qual é a probabilidade de saírem 101 caras seguidas? Decerto muito mais escassa que a de sair uma cara isolada. Não terá então alguma lógica pensar que, tendo eu a informação das 100 caras anteriores, e levando em conta a improbabilidade das 101 caras seguidas, seja mais prudente escolher coroa no 101º lance? A questão aqui é ligeiramente diferente porque a moeda, ao contrário do carro, ainda não é nem coroa nem cara... mas julgo que a resposta já foi dada atrás de forma satisfatória... ou não!
Pedro NA probabilidade de o 101º lançamento dar cara é de 1/2. A probabilidade de saírem 101 caras seguidas é de 1 sobre (2 elevado a 101).
DaigoroDesculpem lá a minha visão extrema (será?), mas não acho que a probabilidade seja 2/3. Acho que é de 1/2 porque são dois acontecimentos isolados. Não acho que exista "herança" de probabilidades, pelo menos, não neste caso. Um acontecimento não influencia o outro, tal como lançar uma vez uma moeda, não influencia a vez seguinte de lançar a moeda. Uma das primeiras noções de probabilidades é a de "unicidade de um acontecimento". Neste problema estamos a falar de 2 acontecimentos isolados. 1º, a probalidade é de 1/3. Depois é de 1/2. Tenho dito.
Depois de muitas voltas na cama e uns rabiscos, concluí sobre o assunto. É verdade que são 2 acontecimentos separados. Se os quisermos juntar, teremos de ter em conta a probabilidade de o concorrente mudar e temos também de aceitar como UM ACONTECIMENTO, o facto de o concorrente ESCOLHER A 1ª PORTA E DEPOIS MUDAR OU NÃO DE OPINIÃO. Posto isto, o nº de casos possíveis é 3x2=6, ou seja, 3 portas ao início e depois, mudar ou não de opinião. Os casos possíveis são: - escolher A e NÃO MUDAR de opinião;+ escolher A e MUDAR de opinião; + escolher B e NÃO MUDAR de opinião;- escolher B e MUDAR de opinião; - escolher C e NÃO MUDAR de opinião;+ escolher C e MUDAR de opinião. Se, por exemplo, o prémio estiver na porta B, as hipóteses que acertam estão assinaladas com um "+" e as outras com um "-". Com uma simples contagem vê-se que temos metade das possibilidades de acertar (1/2). Ora, a questão não é esta! a questão é, será que mudar favorece? Parece que sim: contando aquelas em que se muda E se acerta são 2 em 3 contra 1 em 3 onde não se muda E se acerta. Os tais 2/3 contra 1/3. O que não faz sentido fazer, é separar os 2 acontecimentos para o cálculo da probabilidade de acertar. digamos que para ser favorável mudar, é preciso falhar na primeira escolha. Concluindo, isto só acontece porque se tem de considerar um "acontecimento", o facto de se fazer a 1ª escolha e depois mudar ou não. Para aquele concorrente que chega depois sem saber da 1ªescolha, não é favorável mudar pq se trata de um acontecimento independente e diferente. Não é uma questão de memória do universo nem de misticismo. São só números que são muito exigentes e variam conforme as premissas. Os números, eles sim, eles sabem.
Bom SelvagemNão há paradoxo no problema de Monty Hall. A minha formação universitária de base é matemática e estudei aprofundadamente estatística e probabilidades. Mas aqui o que é preciso é lógica, mais do que probabilidades. Este problema assenta num erro de interpretação do enunciado do mesmo. É que no momento da 2ª escolha, é errado pensar que se ele MANTIVER a porta que escolheu não está de facto a tomar uma nova decisão, como se o facto de o apresentador lhe mostrar outra porta não trouxesse nova informação à escolha inicial. Está, com 50% de chances de ganhar. A probabilidade de ele ganhar, no início do jogo, é sempre de 50% contando que o apresentador lhe vai revelar uma porta sem prémio, nem sequer vale a pena pensar em 1/3's. A primeira escolha surge como um mero pró-forma, porque quer ele acerte ou não, sobra sempre uma porta vazia. Não tentem dar à Matemática um cunho místico e contra-intuitivo que ela não tem. Já li extensivamente sobre este problema na Internet e de facto 99% são a favor da mudança de porta (2/3) contra 1/3. O problema é que não me convencem. Os únicos 2 matemáticos (um professor e um amigo doutorado em Standford) com quem discuti isto cara a cara tiveram a mesma opinião, aliás convenceram-me porque eu vinha da Internet fascinado com a hipótese dos tais 2/3 e fiz de advogado do diabo.
Tiago Souza d'AlteO primeiro argumento do Bom Selvagem deita abaixo as outras teorias. (o segundo nem por isso, anda só à volta de um argumento de autoridade).
Bom Selvagem
Caro Tiago, não foi essa a minha intenção (com o 2º argumento), só queria introduzir o facto de já o ter discutido com colegas e de o problema não ser matematicamente complexo, é mais uma questão de lógica (aí o Solipsista dá cartas). Esta é uma explicação padrão que se encontra na Net: Monty has just shown that one of those two doors - which together have the greater probability of concealing the car - actually conceals a goat. This means that you should definitely switch doors, because the remaining door now has a 2/3 chance of concealing the car. Why? Well, your first choice still has a 1/3 probability of being the correct door, so the additional 2/3 probability must be somewhere else. Since you know that one of the two doors that previously shared the 2/3 probability does not hide the car, you should switch to the other door, which still has a 2/3 chance of concealing the car.
Perplexo
Em relação ao post das 6.40 am!! do Bom Selvagem: Se repetirmos a experiência muitas vezes, na primeira escolha o concorrente escolhe 1/3 de portas premiadas e 2/3 de portas vazias. Sem discussão? Se mudar sempre de porta na segunda oportunidade, muda para vazia no 1/3 que acertara e muda para premiada nos 2/3 que errara. Discussão?
Bom SelvagemEnganei-me. Os acontecimentos não são independentes. De facto o apresentador não vira nunca a porta que escolhemos. Vai sempre virar uma das outras duas portas... A porta que escolhemos da 1ª vez tem influência na acção do apresentador. É mais fácil perceber isto se em vez de 3 portas pensarmos em 100 portas. Escolhemos uma e temos 1/100 hipóteses de ganhar. Depois o apresentador mostra-nos 98 portas vazias. Sobram só duas, a nossa e outra.. será que vale a pena mudar? Claro. Ok, ok, eu gosto é de ser diferente mas vou ter mesmo de me juntar ao gang dos 2/3. E vou bater nos meus dois amigos. Com força.
Tiago Souza d'Alte
Há uma maneira mais simples de testar o dilema: conduzam 100 experiências. 50 pessoas mantêm a decisão; as outras 50 mudam. Se os resultados demonstrarem que no grupo dos 50 que mudaram houve o dobro de respostas certas em relação ao outro grupo, a teoria estará certa. Quanto à questão das 100 portas: em vez de fecharem 98, fechem só uma. Como ficamos?
Bom SelvagemTiago, há na Internet alguns simuladores por computador, mas eles JURAM que se fizeres o teste, por exemplo com cartas, chegas a essa conclusão empírica em pouco tempo... Quanto à questão das 100 portas, caso se abrisse uma ele devia mudar.Passaria de 1/100 para 2/100 (1/50) de chances de ganhar.
Solipsista
Meu caro perplexo, explica-me só mais uma coisa. Disseste atrás que "A probabilidade de o 101º lançamento da moeda dar cara é de 1/2 e a probabilidade de saírem 101 caras seguidas é de 1 sobre (2 elevado a 101)". Então, se já saíram 100 caras seguidas, em que é que ficamos para o lance seguinte? Nos 1/2 ou nos 1 sobre (2 elevado a 101)?
PerplexoO 101º lançamento tem a mesma probabilidade de «caras» que qualquer outro anterior - 1/2. Antes de qualquer lançamento, é que a probabilidade de 101 caras (ou qualquer outra combinação) é de 1 sobre (2 elevado a 101). Vejamos com 3 lançamentos: O 1º tem 1/2 (de «caras»), o segundo - 1/2, o terceiro - 1/2. Mas a probabilidade de sairem 3 «caras» seguidas (antes dos lançamentos)é 1/2 * 1/2 * 1/2 = 1/8. Ou seja, 1 sobre (2 elevado a 3). Que é a mesma probabilidade de sair cara - cara - coroa. Ou coroa - coroa - coroa. Etc. Cada uma das 8 combinações possíveis tem a probabilidade de 1/8 de sair. Depois do 2º lançamento e tendo já obtido 2 caras, já existe a certeza do que antes era só uma probabilidade de 1/4. A incógnita é só o 1/2 do 3º lançamento.
MrPCBSó uma correcção analítica aos cálculos do Bom Selvagem. No caso do problema com 100 portas e se o apresentador fechar apenas uma, embora se mantenha a vantagem em mudar esta não passa para 2/100 ou 2%, mas sim para 99/9800, ou seja algo próximo de 1,0102040816326530612244897959184%. Passo a explicar, as 99 portas não escolhidas representam 99% de probabilidade juntas ou 99/100, eliminando uma a escolha recai sobre as 98 restantes, ou seja 1/98 dos 99/100 de probabilidades que é obviamente igual a 99/9800. Claro está que este tipo de problemas prova-se facilmente com o recurso a cálculo exaustivo. Portanto não se discutem verdades, foram descobertas há muito, apenas compreensões...
Bom SelvagemEnganei-me, a solução é mudar de porta. Os acontecimentos não são independentes, o apresentador não vira a porta que escolhemos na 1ª fase. É mais fácil se imaginarmos 100 portas. Escolhemos uma e o apresentador abre 98 portas. Sobram só duas. Aqui já é intuitivo que devemos mudar de porta.
MrPCBPois é, pois é... na verdade estamos todos aqui a discutir o entender do problema, porque a sua solução não tem mistério, é 1/3 2/3, provado, com selo de aprovação e lacre em cima. Senão faça-se uma simulação como disse o Bom Selvagem enquanto julgava que isso comprovaria a sua teoria. Caro daigoro, é perfeitamente natural que pense que a probabilidade é 50%-50%, é essa a tendência natural do raciocínio humano, no entanto depois das claríssimas explicações nesta discussão creio que já devias desconfiar que estás errado (como aliás todos começamos por estar). Só um comentário que te pode ajudar a entender o teu erro: Os acontecimentos seriam isolados sim, se a localização do carro fosse rebaralhada na passagem à segunda fase. Nesses termos terias de facto 50-50. Uma vez que o carro é colocado atrás da porta no início do problema e continua atrás da mesma porta na segunda fase do problema tens aí a tua herança. Espero ter ajudado à tua compreensão do problema. E como não há duas sem três, deixo aqui um problema também interessante, se bem que não tanto quanto este. Se tivermos dois copos com quantidades iguais de líquidos diferentes (A e B), pegarmos numa colher e passarmos uma colherada do copo A para o B, mexendo bem e em seguida passarmos uma colherada do copo B para o A, mexendo também bem.Teremos o líquido A mais contaminado de B, líquido B mais contaminado de A, ou igualmente contaminados?
PerplexoPor inesperado que seja, ficam ambos igualmente contaminados com o outro líquido, qualquer que sejam os volumes considerados.
NunoO perplexo não tem razão, relativamente à moeda. Se eu tiver uma moeda que atiro 100 vezes ao ar e sai "cara" as 100x, a probabilidade de sair "cara" à 101ªx é muito maior do que coroa, pelo menos se quem atira a moeda ao ar é a mesma pessoa. É uma cena mecânica. Se o mecanismo (neste caso é a pessoa que atira) atirou ao ar uma moeda e saiu sempre "cara", independentemente da probabilidade inerente à duplicidade da moeda, existe a probabilidade relativa ao mecanismo (a pessoa) que atira a moeda. Então, pode dizer-se que, para aquele mecanismo específico de geração de movimento (atirar a moeda ao ar) a probabilidade de um objecto que ostente uma dupla face chegar sequer a mostrar as duas faces é nula, até prova empírica em contrário.
MrPCBIsso só é verdade se o processo mecânico for determinístico. E mesmo no caso do processo ser determinístico há uma taxa de caos a considerar, que representa o inverso da taxa de certeza da afirmação que fazes. Por outras palavras, o que tu dizes é que se saem 100 em 100 caras num sistema em que é sempre a mesma pessoa a atirar a moeda 10cm ao ar e saem 100 em 100 caras num sistema em que também é sempre a mesma pessoa a atirar a moeda ao ar, mas a manda a 10m de altura cheia de rotação, então a probabilidade de cada um tirar cara à 101ª tentativa é igual entre si e superior a 50%. Isto está redondamente errado, como aliás se faz notar bastando pensar no assunto. Tens aqui um exemplo ao estilo Zenão de Eleia que afirmava coisas absurdas, mas para as quais não havia o conhecimento teórico necessário para serem contestadas. O corredor nunca apanhava a tartaruga, porque cada vez que atingia o local onde ela estava esta já se tinha movido mais um pouco... faltava sempre metade do espaço anterior... enfim, uma abordagem discreta a um problema contínuo, não se sabia integrar, nem se conhecia o conceito e ele lá ia passando na sua de manter válida uma teoria que na prática não se aplicava... O que se passa no exemplo anterior é que conforme tu aumentas a complexidade do sistema (aumentando a altura, rodando mais a moeda, mudando de atirador, etc.), há um ponto a partir do qual o factor de caos do próprio sistema se torna insuportável. Esse ponto atinge-se quando uma alteração quântica no estado inicial resultaria numa alteração do resultado final. Ora o nível quântico é não determinístico, pelo que o problema se torna também não determinístico.O simples fenómeno de atirar uma moeda ao ar em rotação, de forma descontraída, é um sistema que ultrapassa essa barreira do caos e no qual já não encontras relação entre as condições iniciais e o resultado final. Logo, que se lixe o interveniente.... Ao que ainda acrescento que, por este motivo, (de não ser dependente da pessoa a partir de determinado nível de complexidade), pode-se aplicar o conhecimento de toda a história do lançamento da moeda, pelo que não se pode afirmar que a probabilidade da moeda mostrar as duas faces é... 50% (aposto em como uma estatística universal o prova à n-ésima casa). É esta a teoria correcta, mais não seja porque é a observável.
Nuno
É possível que a partir de determinado ponto o movimento mecânico que origina a acção perca partes da suas particularidades, tornando-se mais aleatório. Mas, teoricamente, cada indivíduo tem tendência, neste caso, para movimentar o braço de uma forma que lhe é inerente, a menos que seja um "atirador profissional de moeda ao ar" e tenha uma técnica tão desenvolvida que lhe permita ultrapassar a barreira da individualidade e "atirar da forma que lhe é pedida", tal como, por exemplo, um instrumentista de música clássica toca como lhe pedirem, podendo anular os seus próprios "tiques", eliminando assim a sua propensão para tocar desta ou daquela forma; tem a técnica necessária para controlar os seus movimentos, apesar de a forma como cada um movimento os dedos e toca nas cordas ser única, como que uma impressão digital e que coincidência seria se houvesse duas iguais. Aquilo no caso do "atirador de moedas profissional". Se for um indivíduo que não é "atirador de moedas profissional", que não treinou e, logo, não tem o saber que lhe permita controlar a força, a trajectória, enfim, toda a técnica inerente ao controlo do movimento que utiliza para atirar a moeda, esse indivíduo vai atirar a moeda à mesma. Não sabe como a atira, nem tenta controlar o resultado mas, de facto, atira-a e o factor caos acaba por cair no desconhecimento do indivíduo perante o processo e não perante o processo em si. O caos existe no sujeito e não na relação sujeito-objecto, porque esta é um facto empírico, consumado que, sem mais, é o que é e não pode ser mais nada. Assim, o caos reside na mente deste sujeito, na medida em que ele dá origem a uma acção concreta, apesar de não saber como manipular, influenciar, essa mesma acção. O facto de não saber como manipular, influenciar, a acção, não significa, perante a clareza consumada dos factos, que, realmente, fisicamente, esse mesmo indivíduo não tenha influenciado essa ocorrência, antes pelo contrário, pois se foi ele que decidiu e, fisicamente, atirou a moeda ao ar. Agora, não sabemos é determinar essa influência.
BMA:Três acontecimentos constituem um universo em que a sua ocorrência é equiprovável (neste caso 1/3). Mas no caso de o universo de acontecimentos ser encurtado (pelo apresentador) não se distribuirá a probabilidade do acontecimento excluído equitativamente pelos acontecimentos que restaram (neste caso 1/6 para cada acontecimento) o que remete para uma probabilidade de 50% no caso de só existirem 2 portas?
MrPCB:Não!
(Incógnito):Caros amigos, confesso que após a primeira leitura apressada, convicto que a solução só podia ser 1/2, qualifiquei-vos como uns pândegos da pior espécie. Pensei melhor e descobri que afinal falavam sério, acabando pois por compreender o problema. De qualquer modo, perdi um tempo precioso, o que poderá ter desastrosas consequências para o desafio académico que se me aproxima. Não deixarei de vos chamar à responsabilidade junto das instâncias competentes.
Zé NaboAs interpretações deste problema, antes de serem matemáticas, necessitam de uma interpretação psicológica: A solução passa por analisar o nível de probabilidade após o 1º evento, ou seja, se temos duas portas e uma delas tem o carro mas temos uma decisão anterior, podemos partir do principio que não tomamos essa decisão e assume-se que temos 50% de mudar. No entanto, se levarmos em conta a informação veiculada pelo apresentador, temos que introduzir a variante da hipótese de que ele estará numa fase do concurso em que eventualmente precisa de audiências ou não, e portanto, se está ali para nos ajudar ou não para oferecer o prémio - desta forma podemos interpretar a informação que foi transmitida ao concorrente da seguinte forma:
a) se o apresentador está a ajudar existe uma hipótese mais alargada de que a porta que o concorrente escolheu (porta B) seja a errada porque:
a1) o apresentador está a ajudar e a dizer subliminarmente que está na porta A (afinal a porta C foi retirada da lista de hipóteses).
a2) no entanto, pode estar a confundir para criar suspense mas efectivamente o carro está na porta B.
b) se o apresentador não está a ajudar existe uma hipótese mais alargada de que a porta que o concorrente escolheu (porta B) seja a correcta porque:
b1) o apresentador não está a ajudar e confunde a escolha prévia forçando a escolher a porta A como nova escolha.
b2) no entanto, se o concorrente e assumir que não está a ser ajudado deve manter como escolha a porta B.
Para concluir, e se assumirmos que o apresentador não retirará qualquer vantagem da escolha do concorrente, apesar de ter ajudado ao ter dito que a porta C não tinha o carro temos:c1) se o concorrente mantiver a sua escolha na porta B será apelidado de teimoso e:
c1a) se perder será por culpa do mesmo.
c1b) se ganhar será apelidado de clarividente.
c2) se o concorrente mudar a sua escolha para a porta B será apelidado de aventureiro e:
c2a) se perder, ao menos arriscou - era um concurso.
c2b) se ganhar será um destemido sortudo.
KinderFogo.. até quem estuda matemática há anos se depara neste merdoso problema? O bom selvagem disse há uns posts acima que se tivéssemos 100 portas, escolhêssemos 1 e depois o apresentador deixasse apenas a nossa e outra, isso validaria a possibilidade de valer a pena trocar.. mas eu sugiro que ponham os miolos a funcionar.. vale a pena trocar porque? A única diferença é que a primeira escolha que fizeram foi com probabilidade de acertar 1%.. e agora tem a possibilidade de acertar 50%... mas escolher os 50 da esquerda ou os 50 da direita não vai alterar a possibilidade... problema mais básico...
MrPCBAo Kinder: Tão básico que erraste! Repito, não está em causa o resultado, está em causa a compreensão do mesmo. O resultado é conhecido por todo o mundo da matemática há décadas, mais provado que um big-mac, se achas que há 50-50 estás errado, lê os comentários acima. Há muita malta que esclareceu muito bem o problema. A beleza é entender o porquê de não ser 50-50, diria portanto que ainda estás por descobrir a beleza tenta... vale a pena.
Ao Zé Nabo: É uma análise excelente a tua, numa situação da vida real, não se poderia deixar de lado. No entanto este problema não existiu na realidade, usa um cenário "montado" teoricamente para o postular. Pelo que podes cingir-te à matemática sem temer o humor do apresentador.
Zé NaboCaro MrPCB, a minha análise sociológica do assunto não invalida que esta possa ser introduzido na formula matemática como sendo o elemento z - que será o elemento tridimensional do problema que envolve:
a) o humor do apresentador que inclui:
a1) a expressão facial.
a2) a expressão vocal.
a3) a expressão corporal.
a4) a verbalização.
b) a percepção extra sensorial do concorrente.
c) a influência das afirmações do público presente.
d) a influência do público em casa.
Este factor z, digamos que apelidado de factor que envolve uma percentagem não determinada de sorte e percepção mental da interpretação destes elementos, poderá pender a decisão de escolher na 1a ou 2a fase da evolução do concurso. Se assumirmos que na 1a fase o elemento a) não interviu e após a 2a fase do concurso envolvemos na equação de decisão o elemento a) então a percentagem que temos é de: x(porta A) vs. y(porta B) vs. z onde a ponderação de z será maior ou menor dependendo da capacidade do concorrente ser um indivíduo influenciável por estes elementos externos presumivelmente não mensuráveis à excepção do próprio no momento da decisão.
Tiago Souza d'AlteDecorre de todo o trabalho desenvolvido acerca do programa que para muita gente é importantíssimo ganhar um carro num concurso... Valerá tudo isto a pena? Pensar no que seria o mundo se o tempo consumido nestas futilidades fosse aplicado noutras áreas mais produtivas...
Zé Nabo
Sr. Tiago Souza d'Alte, para que saiba a importância de deter um carro, informo-lhe que a taxa de motorização da cidade de Lisboa subiu de 1991 a 2003 cerca de 92% e na cidade do Porto cerca de 55%. Praticamente ninguém pondera a possibilidade de não possuir uma viatura.
Tiago Souza d'AlteÉ bem verdade. Mas a futilidade a que me referia não era ser proprietário de um carro.
PerplexoCaro d'Alte: o progresso da ciência e da técnica foi muitas vezes feito à custa da simples curiosidade dos homens por questões aparentemente corriqueiras. Mesmo a questão destes comentários ou a que lhe está subjacente - a das probabilidades, pode ser muito útil, até no dia-a-dia. Se algum dos visitantes alterar alguma visão mítica das probabilidades para uma compreensão clara, terá valido a pena.
AlexComo é q um assunto tão simples tem tantos comentários?